Fundamentação em Meteorologia Física

As características da troposfera tropical antes do desenvolvimento de um CT

Os CTs são sistemas de baixa pressão de escala sinótica que se desenvolvem sobre o oceano e mostram uma circulação de superfície claramente organizada. Um centro de baixa pressão tropical passa por vários estágios até atingir a condição de CT, sendo classificados de acordo com o vento sustentável de superfície: máximo até 17 m/s - depressões tropicais; máximo entre 18 e 32 m/s - tempestade tropical; máximo acima de 33 m/s - ciclone tropical. Para ocorrer ciclogênese tropical deve existir uma série de condições ambientais precursoras favoráveis como:

i energia termal suficiente [temp. > 26°C até uma profundidade de ~60 m],
ii umidade relativa relaçada de média troposfera (700 hPa),
iii instabilidade condicional,
iv vorticidade ciclônica,
v baixo cisalhamento vertical de vento entre a superfície e a alta troposfera,
vi deslocadmento de pelo menos 5° de latitude distante do equador.

Se as condições acima mencionadas forem mantidas, isto proporciona a situação ideal para uma maior intensificação da perturbação do estágio da tempestade tropical. As águas quentes do oceano dos trópicos formam a principal fonte de energia para alimentar o ciclone tropical. Um distúrbio pré-existente próximo à superfície com vorticidade e convergência suficientes. CTs não podem desenvolver-se espontaneamente, pois necessitam de um sistema levemente organizado com rotação considerável e influxo nos baixos níveis. Uma atmosfera que se resfrie rapidamente com a altura para que seja potencialmente instável à convecção úmida, sendo essa atividade convectiva responsável pela liberação do calor armazenado nas águas para o interior do CT.

Um exemplo deste tipo de tempestade ocorreu em 12 de Agosto de 2009, sobre a áfrica Ocidental. Inicialmente, uma baixa tropical formou-se em um ambiente com baixo cisalhamento vertical e temperatura da superfície do mar (TSM) anormalmente quente e depois desenvolveu-se para uma categoria 3 (Cat. 3) CT, conhecida como Ciclone Tropical Bill, até 18 de agosto. O mapa abaixo mostra a região sobre a bacia tropical do Atlântico Norte onde se formou o CT Bill.

Mapa da temperatura da superfície do mar (TSM) para a bacia tropical do Atlântico Norte. As cores verde, amarelo e laranja mostram TSMs quentes o suficiente para sustentar CT Bill (> 28,8 °C) em 18 de Agosto de 2009.

A intensidade de CT se gradua por meio da escala Saffir-Simpson, sendo classificado de acordo com sua velocidade do vento. é uma escala, 1 a 5, que indica o potencial de destruição de um CT, levando-se em conta: velocidade do vento e dano material causado pela tempestade. Um CT que atinja a categoria 3 ou superior é considerado um risco maior, devido ao seu potencial para perda significativa de vidas e danos materiais.

Categora de CT Saffir-Simpson Velocidade máx. do vento (km h-1) Danos
1 119-153 Mínimo
2 154-177 Moderado
3 178-208 Extenso
4 209-251 Extremo
5 252+ Catastrófico

Mecanismos para o desenvolvimento de uma perturbação tropical em um ciclone tropical - visão geral

Há três mecanismos principais que explicam a gênese e desenvolvimento do CT, em relação aos controles de instabilidade dinâmica:

  1. Mecanismo CISK
  2. Mecanismo WISHE
  3. Mecanismo OT

1. Gênese via mecanismo CISK

CISK ou "Instabilidade Convectiva do Segundo Tipo", é uma teoria popular que explica como depressões tropicais podem evoluir e organizar em CTs. CISK é um mecanismo de feedback positivo, o que significa que uma vez que um processo começa, ele provoca eventos que melhoram o processo original, e todo o ciclo se repete. Uma explicação esquemática do CISK pode ser vista abaixo.

Esquema de uma seção transversal de ciclone tropical, mostrando a circulação radial e vertical (ou transversal) que resulta do atrito, convergência de baixo nível e flutuabilidade na parede do olho e das bandas de chuva, o ar se aquece por causa das grandes quantidades de calor latente liberado. Após estabelecidas as condições de pré-formação, é necessário ainda a presença de algum tipo de instabilidade para aprofundar o sistema, neste caso, é comumente observada a presença CISK ou a instabilidade da interação entre o ar-mar.

Um fluxo friccional de ar na superfície é "desviado" para dentro, em espiral em direção ao centro de um sistema de baixa pressão, onde cria convergência (setas horizontais vermelhas). A continuidade de massa em seguida, rege o movimento para cima, forçando o ar a subir no centro (seta vertical azul). Este processo é conhecido como "Bombeamento Ekman". O ar esfria e, quando saturado, a umidade se condensa, liberando calor latente para o ar. é este calor latente que fornece a energia para alimentar essas tempestades. Se condicionalmente instável, o movimento ascendente vai continuar e aumentar uma circulação secundária. O vórtice se esticará, o que desenvolve e intensifica a vorticidade ciclônica de baixo nível (através da conservação do momento angular).

2. Gênese via mecanismo WISHE

WISHE ou "Intercâmbio de calor de superfície induzida por vento", pressupõe que a atmosfera tropical não é condicionalmente instável, e portanto não podem ser mantidos unicamente pela retroalimentação entre a circulação e intensos fluxos de calor latente do oceano, como ocorre com o mecanismo CISK. Esse mecanismo caracteriza-se por um núcleo quente verticalmente alinhado (barotrópico) e muito profundo, indo desde a superfície até a tropopausa; o maior aquecimento ocorre nas camadas superiores da troposfera. Esta grande extensão vertical do núcleo quente é a chave da sustentação do ciclone pelos fluxos de calor latente intensos da superfície do oceano, segundo o mecanismo mais aceito atualmente para o desenvolvimento tropical.

3. Gênese via mecanismo OT

OT ou "Overshooting Top", também conhecido como "Hot Tower", assume que a atmosfera é condicionalmente instável. O processo de intensificação do ciclone ocorre principalmente através da vorticidade negativa em baixos e altos níveis da troposfera, que amplificam as ondas em médios níveis e consequentemente o gradiente vertical de vorticidade ciclônica.

OT (fluxo ascendente flutuante) desenvolvem e alimentam a instabilidade condicional (vorticidade mínima de baixo nível). A aceleração ascendente leva ao alongamento do vórtice à convergência de baixo nível (via conservação do momento angular) da vorticidade de fundo (vorticidade de baixo nível considerável).

Esquema de uma sessão vertical típica de um vótice ciclônico de meso-escala (VCM).

Processos meteorológicos para algumas características da etapa #3 (CT)

As seguintes imagens do satélite Meteosat-9 do TC Bill (2009) mostram o desenvolvimento de tops overshooting (fluxo ascendente flutuante) quando a tempestade se intensifica; além de vórtices da parede ocular e a formação de um olho assimétrico. A aceleração ascendente leva ao alongamento do vórtice e convergência de baixo nível (da conservação de momento angular) da vorticidade de fundo.

18 Agosto 2009 / 12:00 UTC. Imagens IR Meteosat-9 sobreposta ao GFS com as linhas de fluxo em 850 hPa, para o CT Bill (2009) no estágio #3.

18 Agosto 2009 / 12:00 UTC. Imagem Realçada Meteosat-9 IR 10.8 μm.

18 Agosto 2009 / 12:00 UTC. Imagem RGB Meteosat-9 (composição: WV 6.2μm menos WV 7.3μm, IR 3.9μm menos IR 10.8μm, NIR 1.6μm menos VIS 0.6μm), mostrando as bandas de nuvens convectivas do CT Bill (2009) no estágio #3.

Um conjunto organizado de células convectivas ficam concentradas próxima ao olho do CT Bill. Esta região é conhecida como a parede do olho, e é no flanco interno deste anel de tempestade que encontramos os ventos mais fortes, como mostrado no diagrama esquemático abaixo.

Esquema dos efeitos do padrão de cisalhamento do vento no CT.

Nas imagens do satélite Meteosat-9 acima, observa-se a presença das células convectivas em forma de torre, conhecidas como torres quentes (overshootings tops), na parede do olho de Bill, o anel de nuvens que circundam o olho do CT. Vários "overshooting tops" com resfriamento abaixo de -72°C podem ser encontrados nas imagens. As torres quentes podem facilmente atingir a base da estratosfera. Esses canais quentes em forma de torre empurram para cima o ar úmido dentro dos CTs, formando uma espécie de motor e é um dos mais importantes processos verificados no mecanismo OT. A transferência de calor latente do oceano para a atmosfera é mais eficiente quanto maior a TSM e com fraco cisalhamento vertical do vento horizontal.

O padrão do olho representa o contraste de temperatura entre a parte mais quente do olho e a convecção circundante mais fria. Quanto maior for este contraste de temperatura, mais forte será o CT. O padrão de bandas curvas baseia-se na ideia de que quanto mais as ondas de chuva envolvem a área de baixa pressão, maior é a vorticidade do sistema. Este padrão de banda curva é muitas vezes mais fácil de seguir em imagens IR realçadas do que em imagens VIS. A região de chuva também é maior e está localizada do lado oposto à superfície dos ventos mais fortes em relação ao centro de baixa pressão. A combinação entre o fraco cisalhamento vertical do vento e a forte convecção resulta em uma banda curva, com o ar quente que sobe para as camadas superiores da atmosfera.

O cisalhamento vertical do vento no ambiente de CT é muito importante. O cisalhamento do vento é frequentemente definido como a diferença vetorial entre ventos em duas altitudes (850 e 200 hPa). Como mostrado no esquema abaixo, quando o cisalhamento do vento é fraco, as tempestades que são partes do ciclone crescem verticalmente, e o calor latente da condensação é liberado para o ar diretamente acima da tempestade, apoiando o seu desenvolvimento. Quando há um cisalhamento de vento mais forte, isto significa que as tempestades se tornam mais inclinadas e a libertação de calor latente é dispersa numa área muito maior. Assim, os vórtices que se formam entre o ar calmo do olho do furacão e a intensa circulação na parede ao seu redor, carregam muito calor e umidade desde olho em direção à parede e agem como uma turbina no mecanismo dos CTs.

Esquema de superposição e convecção divergente nos níveis superiores mostrando descida assimétrica de mesoescala (aquecimento adiabático) no olho, o que diminui a pressão, aumentando o gradiente de pressão e os ventos horizontais.

Caminhos típicos para o desenvolvimento de CT

Existem três caminhos potencialmente identificados para a ciclogênese na bacia tropical do Atlântico Norte:

  • Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) para dar condições sinóticas de vorticidade.
  • Ondas atmosféricas equatoriais movendo-se para o leste, conhecidas como ondas de leste equatorial. As ondas do leste equatorial são semelhantes às ondas nas latitudes médias, porém estas encontram-se de baixo até médios níveis (abaixo de 700 hPa). A convergência associada a estas ondas cria tempestades que podem, em última análise, alcançar a força de CT.
  • Ao longo de zonas frontais que derivam do golfo do México ou no litoral da Florida. A esteira transportadora associada a essas frentes pode ser suficiente para iniciar tempestades e se as condições atmosféricas e oceânicas forem suficientes, os ciclones subtropicais podem se formar e se transformar em ciclones tropicais.

Alguns ciclones tropicais, tais como Bill (2009), começam a partir de ondas de leste africanas. As ondas de leste africanas são geradas devido à combinação da instabilidade barotrópica e baroclínica do jato africano. Têm um período de 3-5 dias, um comprimento de onda de 2000 - 2500 km e atingem a longitude máxima na baixa troposfera. Elas podem-se propagar com direção oeste cruzando o Atlântico Norte tropical e subtropical e podem atingir o mar caribenho e a região ocidental do Atlântico Norte.

Diagrama esquemático da estrutura vertical das ondas de leste sobre a África Subsaariana.

Esquema mostrando a relação entre o padrão de nebulosidade em forma de "V invertido" e o escoamento na baixa troposfera.