Fundamentação em Meteorologia Física
O primeiro modelo conceitual realista de ciclones extratropicais foi apresentado por Bjerknes em 1919, seguido pelo de Bjerknes e Solberg em 1922. Eles apresentaram a teoria de que as ciclogêneses estão associadas com a existência de um gradiente horizontal de temperatura na superfície e que a intensificação do ciclone ocorre quando a frente fria gira em torno do centro de baixa pressão, até encontrar o ar quente da frente quente.
O desenvolvimento de ciclones próximos à costa do Uruguai e sul do Brasil estão associados a cavados (núcleo frio) em níveis médio/superior da atmosfera, que se movem do Pacífico ao oceano Atlântico (como mostrado na figura abaixo). Estes ciclones não aparecem imediatamente após a Cordilheira dos Andes. Em vez disso, a ciclogênese ocorre a aproximadamente 1000 km do Andes (Vera et al., 2002).
Fatores que criam condições favoráveis para o desenvolvimento dos ciclones incluem: gradiente horizontal de temperatura do ar formado por temperaturas mais quentes sobre o continente e mais frias sobre o oceano, devido às correntes do Brasil e Malvinas (figura abaixo) e ar úmido no lado leste do ciclone e ar seco no lado oeste, combinado com um cavado ou um vórtice ciclônico de altos níveis em níveis superiores.
Às vezes, um ciclone em superfície pode se desenvolver quando há advecção de ar quente da região amazônica para o norte da Argentina (jato de baixos níveis) e há um cavado ou um vórtice ciclônico em altos níveis cruzando os Andes. Em ambos os casos o ciclone irá se desenvolver e propagar-se em sentido leste ou sudeste (figuras B e C abaixo). A fase de oclusão é geralmente alcançada sobre o oceano Atlântico Sul (figura D abaixo).
Os ciclones com desenvolvimento próximo ao Uruguai e sul do Brasil são ligeiramente diferentes aos descritos no modelo conceitual por Bjerknes e Solberg (1922):
- Em contraste com o modelo desses autores, ciclones formados próximo ao Uruguai e sul do Brasil não mostram um padrão de onda em superfície durante sua fase inicial, devido aos efeitos da região montanhosa e de instabilidade baroclínica. A sua formação é favorecida em grande parte pela advecção horizontal de vorticidade relativa de um cavado ou de um vórtice ciclônico de altos níveis que atravessam os Andes;
- Outra diferença em relação ao modelo de Bjerknes e Solberg é que os ciclones próximos ao Uruguai e sul do Brasil no seu início não exibem um centro assimétrico (ar frio no setor oeste do ciclone e quente no leste), que, em seguida, transforma-se em um ciclone de núcleo frio durante a fase de oclusão. Em vez disso, o centro do ciclone permanece quente da sua geração até à sua fase de enfraquecimento.
Modelo conceitual do desenvolvimento de um ciclone extratropical sobre a América do Sul. As linhas pretas com seta representam a altura geopotencial em 500-hPa; triângulos pretos e semicírculos representam frentes frias e quentes, respectivamente. As letras em negrito A e B indicam a posição dos centros de alta e baixa pressão, respectivamente, em 500 hPa e a letra vermelha B indica a posição do ciclone de superfície. As áreas sombreadas mostram a nebulosidade associada com as frentes e com o ciclone. Fonte: adapatado de Celemín (1984).
Média mensal da temperatura (°C) sobre o Oceano Atlântico Sul de 1982 a 2002. é possível identificar a confluência atual Brasil-Malvinas perto das costas do Uruguai e sul do Brasil. Fonte: Reboita (2008).
Localização Geográfica e Variação Sazonal
Os ciclones extratropicais ocorrem principalmente ao longo de duas áreas da América do Sul (Gan e Rao, 1992): Uruguai e Golfo San Matias na Argentina (figura abaixo). Durante o inverno, a frequência dos ciclones é maior sobre o Uruguai do que sobre o Golfo San Matias. No verão, ocorre o oposto. Esta sazonalidade é associada com o deslocamento da baroclinia causada pelos gradientes de temperatura da superfície do mar.
Reboita et al. (2010) observaram que, durante o verão, há uma terceira região com frequência máxima de ciclogêneses: entre a costa das regiões sul e sudeste do Brasil (figura abaixo).
Normalmente, os ciclones se formam próximos à costa e propagam-se para leste, alcançando sua intensidade máxima sobre o oceano Atlântico Sul. Entre maio a setembro, muitos ciclones que se formam sobre o Uruguai, costa da Argentina e sul do Brasil experimentam intensificação quando se propagam do continente para o oceano em função dos gradientes verticais de fluxos de calor latente e sensível do mar para o ar.
Distribuição anual de isolinhas mostrando a frequência de ciclogêneses. Fonte: Gan e Rao (1992) Densidade de ciclogêneses entre 1990-1999. A densidade é o número de sistemas dividido por uma área de 5° x 5° de latitude-longitude e multiplicado por 104. Fonte: Reboita et al. (2010)